Em São Paulo, um câncer é só mais um câncer. Um desmaio em um bar domingo a noite é casual, e nada se mobiliza. Talvez a levem para casa e nem precisem forçar o sexo. Um carro atravessado no meio do canteiro da via expressa leva horas para ser retirado. Uma senhora de 59 anos irradia simpatia a um outro velho na fila do cinema, em mais uma tentativa de romance, porque não suporta mais a solitária companhia da sua TV e do concreto. Se concreto fizesse sexo, em São Paulo não existiria solidão. E os vôos, são tantos vôos em meio ao céu poluído, que é normal o nome de Arnaldo Antunes ser anunciado nos falantes da sala de espera do aeroporto, porque ele está atrasado para o embarque. Mas são tantos Arnaldos Antunes, pedreiros, operários, advogados, executivos, loucos e mendigos. Um lixão humano a céu aberto. Mas um depósito de lixo pode ser tão divertido como um parque de diversões na esperança do garimpo de um algum tesouro descartado. São Paulo passa logo e nem dá tempo de ficar cabisbaixo, porque senão, se acaba sufocado. Saia de casa e entre algum boteco com um balconista paraibano. Embriague-se e esqueça que o esgoto corre acima do solo e os carros trafegam em túneis, que o mundo é sujo e não há tempo para o belo ser aprazível. No fim, o dinheiro dita a medida da velocidade. Com um ou mil reais, se tem alguma opção. A diferença é o espaço físico proporcional ao valor do aluguel do seu apartamento.