Quando retornei ao upstairs apos uma volta pelo dancefloor, ela veio conversar comigo. Nos tinhamos assistido a banda em alguma de sintonia. Eu a disse que estava prestando atencao na Mustang da garota, pois precisava decidir entre uma Mustang e uma Jazzmaster. Ela me disse que trabalhava em uma label que compra, vende e produz discos em Holloway Road. Nao entendi o nome da loja.

Katherine, este he seu nome, tambem he baterista em uma banda com dois singles gravados em vinis de sete polegadas. Ela prometeu me dar ambos. Certo dia ela estava voltando de uma festa e por acaso Pete Doherty estava no mesmo carro, entao ele guiou todos ate a casa de Kate Moss e perguntou se alguem estava afim de ficar alto. Perguntei se ele era um cara legal - "Sim - so sweet, e ganhou um monte de dinheiro, so isso, mas eu nao gosto do Libertines nem do Babyshambles". Do Libetines eu gosto, do Babyshambles nao tambem.

Ela nao era bonita, com cabelos encaracolados claros sarere e vestia uma uma blusa de malha verde com um botton com uma cifra musical, mas tinha um beijo acima da media inglesa, acho que melhor que o de Suzie, agora voce he a segunda no meu ranking Suzie. Sugeri a ela que fossemos embora, estava dificil de escuta-la, "Mas voce quer ir embora comigo por que esta bebado ou porque gosta de mim?"

- "Nao, eu gosto de voce, voce pode sentir, eu posso ver"

Entao saimos rumo ao caos da Charring Cross 4:30 da madrugada, o pedaco matinal mais faminto de toda Londres.

- "Voce nao quer tomar um cafe? Eu quero tomar um cha".
- "Ok, podemos ir".

Caminhamos por alguns cafes que nao serviam cafes naquela hora, somente pedacos de pizza que passaram o dia todo na vitrine.
Beijei-a novamente na travessa que da acesso ao Soho e perguntei pelo seu onibus.

- "Sim, he o mesmo ponto que o seu"
- "Entao vamos"

Trocamos telefones e ela parecia extramamente feliz por ter me encontrado.
Meu onibus chegou primeiro que o dela. Disse adeus e me fui. Do onibus enviei uma mensagem para seu celular.

-"Vejo voce Katherine, espero pelos seus singles".
-"Safe journey home, will get those your records soon, xxx"

Nao sei quando a verei novamente.

Pena que nao tem no Brasil, mas o meu eu comprei por aqui por apenas tres libras na Fopp de Camdem Town. Down and out in Paris and London he o registro autobiografico dos dias que George Orwell (este he o primeiro livro que leio dele) passou escrevendo esporadicamente artigos diretamente de Paris; trabalhando como plongeur (termo em frances para lavador de pratos) e garcon e ganhando o suficiente para sobreviver com pao e vinho em hoteis baratos.

Cenario Buckowskiniano mesmo quando Buckowsky ainda aprendia o alfabeto, o escritor descreve com maestria os padroes de trabalho e servico do modelo europeu, onde uma monte de gente suja e mal remunerada prepara pratos igualmente sujos, porem bem aparentados que sao vendidos como livres de qualquer olhar de mosquito.Como a regra basica de servicos de hoteis e restaurantes de todo o mundo "Quanto mais proximo do cliente, mais limpo deve aparentar o produto", porem so quando se adentra os bastidores pode se conhecer os verdadeiros caminhos do processo.

Aprendi bastante sobre isto enquando trabalhava Queen Elizabeth II Conference Centre, em Westminster, ao lado do Big Ben, um dos mais requisitados centro de conferencias de Londres. Vinhamos todo o staff adcional da agencia de Notting Hill: mexicanos, brasileiros, franceses, espanhois, africanos. Um dos mexicanos chegava sempre com o cabelo todo ensebado da noite anterior e minutos antes de vestirmos nossos uniformes, lambuzava ainda mais aquilo com agua para dar um aspecto de gel molhado, entao vestiamos as camisas pretas e estavamos prontos para o trabalho.

Nosso servico era basicamente esperar por quando as pessoas vinham para os intervalos das conferencias, entao saiamos para recolhermos as chicaras usadas no cafe. A importancia do servico nao era em si recolher as chicaras, mas sim a rapidez do servico, de forma que o lugar aparentasse como limpo todo o tempo. Desta forma, a agencia enviava tantos de nos que certas vezes era mais conveniente colocar um sobre a bandeija do outro, pois eramos tantos que ficavamos nos trombando com nossas bandeijas vazias.

Nos intervalos entre estes breaks, voltavamos a cozinha, as vezes tomavamos um cafe e comiamos biscoitos para em seguida iniciarmos a preparacao do almoco. Para o lunch, colocavamos as tacas e pratos nas mesas e faziamos o set-up dos pratos quentes. Entre uma tarefa e outra havia um espaco de tempo o qual ficavamos polindo os pratos e talheres, com guardanapos e agua quente. Isto he uma tarefa que existe em qualquer restaurante europeu. Normalmente, as locas sao lavadas por maquinas e geralmente voltam para ser reutilizadas sujas, com manchas e ate pedacos de comida. Esta tarefa tomava-nos um bom tempo, mas no final elas ficavam tao lustrosas quanto o cabelo do mexicano, que os clientes pensavam ter usado gel fixador para dar aquele aspecto brilhoso.

Sai de casa quase as quarto da tarde com destino a Brick Lane. Teria que cruzar toda a cidade sentido oeste – leste para chegar a Beco de Tijolos. Desci em Bethnal Green e segui caminando. Eu usava uma jaqueta que Gustavo havia me deixado apos sua reestilizacao. Ela me caia muito bem e brilhava junto ao meu cachecol cinza.

Apos algunas quadras caminhando, deparei me com uma inglesa, vindo em sentido contrario ao meu, ela me parou e em uma atitude tipica para um flerte me perguntou se eu tinha fogo para o seu cigarro. Fui pego desprevenido e embarassosamente respondi “No, no” ao inves de ser mais educado e dizer “Oh, I’m sorry, but I don’t have a lighter”. Isto revelou um pouco da pouca espontaneidade do meu ingles, porem eu me recuperei rapido e devolvi a ela “Estou indo a Brick Lane, vc sabe como posso chegar ate la? Esta era a questao exata, pois a nossa empatia surgiu dai: ela sabia exatamente que eu estava indo para la como eu sabia que ela estava indo de la. Quando se chega nos arredores de Brick Lane comeca a se encontrar todos os estereotipos descolados da cidade, os indies, a galera do cinema, os japoneses bem vestidos, toda uma multidao aspirante a artista.

Ouvi atentamente sua resposta e quando ela terminou olhei em seus olhos, ela me olhou e eu sorri, como se dissesse, “E ai, eu te amo!” pois era isto que eu sentia sozinho naquele momento e ela bastante atraente, mas ja era tarde, e tao inesperado quanto saltou para dentro de mim, ela partiu de volta para sua caminhada rumo ao leste da cidade, e eu para Brick Lane. Passei algum tempo rodando pelas lojas, fazendo um trabalho de garimpeiro pobre, disposto a encontrar mas nao encourajado a pagar. Olhei por camisetas, discos, calcas Levi’s de segunda mao recondicionadas perna fina, no melhor estilo mod quadrophenia, e sai de la lembrando Ginsberg “Londres, quando poderei adentrar te e sair de sacotas cheias pagando lhe apenas com meu charme?”.